O
Des. Ricardo Duailibe atendeu o pedido de efeito suspensivo, interposto por
Valéria Cristina Pimentel Leal – a Valéria do Manin, contra a decisão proferida
pelo Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Araioses /MA que, concedeu a
liminar determinando o afastamento dela das funções de prefeita de Araioses.
Deferiu o pedido de efeito suspensivo
ao recurso e determinar o seu retorno ao cargo de Prefeita do Município de
Araioses.
Abaixo a decisão do Des. Ricardo Duailibe:
QUINTA CÂMARA CÍVEL
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 9513-80.2016.8.10.0000 (59924/2016) –
ARAIOSES
AGRAVANTE: Valéria Cristina Pimentel Leal
ADVOGADO: Dr. Danilo Mohana Pinheiro Carvalho Lima (OAB/MA
9022)
AGRAVADO: Ministério Público Estadual
PROMOTOR: Dr. Samara Cristina Mesquita Pinheiro Caldas
RELATOR: Desembargador RICARDO DUAILIBE
DECISÃO
Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de efeito
suspensivo, interposto por Valéria Cristina Pimentel Leal, contra a decisão
proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Araioses (MA) que, nos
autos da Ação Civil Pública, concedeu a liminar pretendida para determinar o
afastamento da Agravante do cargo de Prefeita do Município de Araioses/MA.
Em suas razões recursais (fls. 03/22), a Agravante sustenta,
preliminarmente, a ocorrência de julgamento ultra petita, uma vez que o
Agravado não teria realizado o pedido de afastamento em sua exordial, motivo
pelo qual entende que deve ser reconhecida a nulidade da decisão agravada.
Adentrando no mérito, aponta, com fulcro no disposto no art. 2º da
Lei 8.437/92, a ilegalidade do seu afastamento, diante da necessidade de sua
prévia oitiva, no prazo de 72 (setenta e duas) horas, antes de ser decidida a
questão liminar.
Descreve a ausência dos requisitos para a concessão do pleito
pretendido, posto que as medidas tendentes a atrapalhar o andamento do processo
devem ser exaustivamente demonstradas e não fundadas em mera suposição, sob
pena de afrontar o art. 20, parágrafo único, da Lei de Improbidade
Administrativa e os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Além de ilegal, defende ser inconstitucional a decisão proferida
pelo Juízo de base, por violar os princípios constitucionais da autonomia,
independência e harmonia dos poderes e da não intervenção, afetando, ademais, a
finança e a ordem pública e econômica.
Descreve que o Município de Araioses já teria pago todas as verbas
devidas aos servidores, sejam estes efetivos ou contratados, antes mesmo do
deferimento da medida liminar, não restando nenhuma verba trabalhista em
atraso.
Ao final, requer a concessão de efeito suspensivo ao recurso, para
suspender os efeitos da decisão guerreada. No mérito, roga pelo conhecimento e
provimento do recurso, para reformar integralmente a decisão proferida pelo
Juízo de origem.
Compõem o instrumento os documentos de fls. 23/123.
Inicialmente distribuído em sede de Plantão, o então Plantonista,
Desembargador Antônio Fernando Bayma Araújo, converteu o procedimento em
diligências, determinando que a Agravante fosse intimada para que, no prazo de
72 (setenta e duas horas), trouxesse aos autos os elementos necessários à
apreciação do pleito, notadamente quanto à comprovação e detalhamento da
quitação das verbas trabalhistas devidas ao funcionalismo público daquela
municipalidade (fls. 127/128).
Após o feito ter sido distribuído para esta Relatoria, a Agravante
peticionou às fls. 132 requerendo a juntada dos documentos de fls. 133 a 1.158.
É o relatório.
Em sede de análise prefacial, reputo satisfeitos os pressupostos
de admissibilidade do Agravo e verifico que se encontram presentes os
requisitos para a sua interposição, bem como os documentos obrigatórios e
facultativos previstos no art. 1.107 do NCPC, razão que me leva a deferir seu
processamento.
Para a concessão de efeito suspensivo ao Agravo de Instrumento,
previsto nos artigos 995, parágrafo único, e 1.019, inciso I, ambos do Novo
Código de Processo Civil, faz-se necessário que a imediata produção dos efeitos
da decisão agravada importe em risco de dano grave, ou de difícil reparação, e
fique demonstrada a probabilidade de provimento do recurso.
Ultrapassada a análise desses aspectos introdutórios e partindo
para o enfrentamento do pleito formulado no recurso, observa-se que a questão
cinge-se, em síntese, ao afastamento da Agravante do cargo de Prefeita do
Município de Araioses/MA.
Pois bem. Analisando as razões formuladas no presente recurso, bem
como os demais elementos probatórios a ele carreados, entendo, em sede de
cognição sumária, ser prudente rever a decisão que determinou o afastamento da
Agravante. Explico:
Não se verifica, a princípio, que a decisão combatida
seria ultra petita, uma vez que, embora não se verifique requerimento
expresso ao final da vestibular apresentada, constata-se na Ação Civil Pública
de origem (Processo nº. 1658/2016), tópico específico e pedido clarividente
do Parquet Estadual solicitando o afastamento da Agravante,
embasando-o no fato de que esta estaria sonegando informações acerca da real
situação financeira daquela municipalidade, prejudicando, sobremaneira, a
instrução da Ação Civil Pública nº 1379/2016, que trata a respeito do pagamento
dos salários atrasados do funcionalismo público municipal.
Ademais, é assente na jurisprudência pátria que a inicial deve ser
interpretada de maneira lógico-sistemática, não devendo ater-se apenas ao
capítulo referente ao pedido. Nesse sentido, cite-se precedente do C. STJ:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
DÉBITOS CONDOMINIAIS. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. JULGAMENTO ULTRA PETITA.
NÃO OCORRÊNCIA. EXECUÇÃO. TÍTULO JUDICIAL. OBRIGAÇÃO CONDOMINIAL.
PROPTER REM. PENHORA DO BEM. PROPRIETÁRIA. 1.
O pleito inicial deve ser interpretado em consonância com a pretensão deduzida
como um todo. Desse modo, o acolhimento do pedido extraído da interpretação
lógico-sistemática da petição inicial não implica julgamento fora do
pedido 2. É certo que, nos termos da
jurisprudência da 2ª Seção, a responsabilidade pelo pagamento de cotas
condominiais em atraso pode recair, em certos casos, sobre o novo adquirente do
imóvel. 3. É necessária a vinculação entre o polo passivo da ação de
conhecimento, onde formado o título judicial, e o polo passivo da ação de
execução, nas hipóteses de cobrança de cotas condominiais. 4. Agravo interno a que
se nega provimento. (AgInt no AREsp 936.344/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL
GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 01/12/2016, DJe 09/12/2016) (Ressaltei)
Todavia, o afastamento do chefe do Poder Executivo do seu cargo, a
teor do disposto no art. 20, parágrafo único, da Lei de Improbidade
Administrativa, é possível quando esta medida se fizer necessária à instrução
processual, in verbis:
Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos
políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa
competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do
cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer
necessária à instrução processual.
Nesse aspecto, o C. STJ posiciona-se pela excepcionalidade da
medida, admitindo-a apenas quando houver existência de risco efetivo à
instrução processual:
PEDIDO DE SUSPENSÃO DE MEDIDA LIMINAR. AFASTAMENTO DE PREFEITO.
LESÃO À ORDEM PÚBLICA. A norma do art. 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429, de
1992, que prevê o afastamento cautelar do agente público durante a apuração dos
atos de improbidade administrativa, só pode ser aplicada em situação
excepcional, como a dos autos. Hipótese em que a medida está fundada na
existência de indícios de manipulação dos documentos públicos relativos às
irregularidades apuradas, bem como na influência do requerente na produção da
prova testemunhal, o que evidencia risco efetivo à instrução processual. Agravo
regimental não provido. (STJ – AgRg na SLS: 1382 CE 2011/0082222-6, Relator:
Ministro ARI PARGENDLER, Data de Julgamento: 01/06/2011, CE – CORTE ESPECIAL,
Data de Publicação: DJe 23/09/2011)
Dito isto, analisando a exordial apresentada
pelo Parquet às fls. 31/36, verifica-se que este pauta o pedido
de afastamento sob o fundamento de que a continuidade da Agravante no cargo
poderá causar danos morais e patrimoniais ainda mais graves ao ente público, e
que esta realizava uma péssima administração, objetivando, dessa forma,
assegurar a integralidade do patrimônio público, da moralidade administrativa e
o processo, de modo que não venha a influir na produção das provas,
resguardando a justiça da futura sentença. Ademais, argumenta que a folha de
pagamento estaria sendo sonegada pela Agravante nos autos do Processo nº.
1379/2016.
A Agravante, por sua vez, apenas após a determinação exarada às
fls. 127/128 pelo Desembargador Antônio Fernando Bayma Araújo peticionou nos
autos às fls. 133 a 1.158 trazendo os documentos que comprovariam o pagamento
do funcionalismo público municipal.
Nesse contexto, em que pese a relevância dos argumentos apontados,
não vislumbro, em sede de cognição sumária, elementos concretos que evidenciem
a necessidade de afastamento da Agravante do cargo para o qual fora
regularmente eleita, porquanto não se constate notório prejuízo à instrução
processual, mormente porque está ainda se encontra em fase inicial, sendo
plenamente possível obter a documentação necessária durante o seu regular
transcurso.
A jurisprudência deste E. Tribunal é firme pelo afastamento
cautelar do agente público do cargo apenas quando este for indispensável,
devendo estar amplamente configurada a atitude da parte em ameaçar a instrução
do processo:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. DECISÃO QUE
DEFERIU PEDIDO DE SUSPENSÃO DE LIMINAR. DECISÃO DO JUIZ EM AUTOS DE AÇÃO DE
IMPROBRIDADE ADMINISTRATIVA QUE AFASTOU LIMINARMENTE O PREFEITO MUNICIPAL. Não
tendo o recorrente demonstrado, em suas razões de agravo regimental, que a
permanência do Prefeito Municipal no cargo causará prejuízos à instrução do
processo a que este responde alusivo a ação civil por ato de improbidade
administrativa ou continuará praticando atos de improbidade em detrimento do
erário, impõe-se a manutenção da decisão agravada que, deferindo o pedido de
suspensão de liminar, suspendeu os efeitos da decisão do juiz que, ao receber a
inicial da ação de improbidade, determinou o afastamento do agente público do
cargo. De acordo com precedente do STJ, o afastamento cautelar do agente
público de seu cargo, previsto no p. único do art. 20, da Lei nº 8.429/92,
somente se legitima como medida excepcional, quando for manifesta a sua
indispensabilidade, não se configurando a situação de excepcionalidade sem a
demonstração de um comportamento do agente que importe em efetiva ameaça à
instrução do processo, não bastando para tal a mera cogitação teórica da
possibilidade da sua ocorrência (STJ, 1ª T, REsp 550.135/MG, Rel. Min. Teori
Albino Zavascki, j. 17.02.0004, DJ 08.03.2004, p. 177). Agravo regimental
improvido. (TJ/MA – Processo nº. 44016/2015 – Des. Jamil de Miranda Gedeon Neto
– 21.10.2015)
Em caso análogo, este E. Tribunal de Justiça posicionou-se contra
o afastamento cautelar do prefeito:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. AFASTAMENTO CAUTELAR DE PREFEITO. POSSIBILIDADE DE RETORNO AO
CARGO. GRAVIDADE DO FATO. GRAVE RISCO À INSTRUÇÃO. AUSÊNCIA. NECESSIDADE.
PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PROVIMENTO. 1. O
art. 20, parágrafo único, da Lei no 8.429/1992 prevê que o afastamento cautelar
do agente público durante a apuração dos atos de improbidade administrativa, há
de ser aplicada quando existirem elementos suficientes de que o agente esteja
atuando no sentido de dificultar a instrução processual e esquivar-se das
sanções cominadas na Lei de Improbidade Administrativa. Sem informar
precisamente os fatos em que indicam tal necessidade, não há possibilidade de
aplicação de tal regra. Requisitos não se mostram presentes em conjunto,
sobretudo no que se refere ao risco de dano em caso de manutenção do agente no
cargo. Possibilidade de retorno ao exercício da função. 2. Situação em que não
restou demonstrada a justa causa necessária ao deferimento da medida de
afastamento. Entende-se por justa causa exclusivamente ao suposto risco gerado
para a instrução processual da ação civil pública de improbidade administrativa
e não em relação à gravidade da medida a que se apura. Não se há confundir, com
efeito, gravidade de suposta conduta com garantia da instrução processual.
Precedentes. 3. O momento atual do processo não permite antecipação do
julgamento de mérito, sob pena de quebra dos princípios constitucionais do
devido processo legal e presunção de inocência, até que a sentença final assim
conclua. 4. O afastamento cautelar de prefeito se faz necessário quando este
concretamente estiver interferindo na condução do processo (ação de
improbidade) e prejudicando a instrução processual. O atraso de salário, não
obstante a gravidade do caso e a sua repercussão, é questão meritória,
sobretudo de grande notoriedade que não se ampara na excepcionalidade do art.
20 da já citada Lei nº. 8.429/92[1],
ou seja, pode e talvez deva resultar em condenação final. Retorno da prefeita
ao cargo. 5. Recurso provido. (TJMA – Processo nº. 19316/2016. Rel.
Desembargador Lourival de Jesus Serejo Sousa. – 07/07/2016).
Considerando, outrossim, que a Agravante não foi reeleita para o
cargo, a manutenção da decisão vergasta caracterizar-se-á como verdadeira
cassação do seu mandato, sendo plenamente possível obter a documentação
necessária perante a nova Administração Municipal, até porque a Ré, ora
Agravante, permanece respondendo na referida ação.
Ante o exposto, defiro o pedido de efeito suspensivo ao recurso, sobrestando os efeitos
da decisão agravada, de modo a determinar o retorno da Agravante ao cargo de
Prefeita do Município de Araioses/MA, sem prejuízo de reanalisar a questão
quando de sua análise perante esta C. Câmara.
Intime-se o Agravado para que responda, se assim desejar, ao
presente recurso no prazo da lei, ficando-lhe facultada a juntada de
documentos.
Notifique-se o Juízo do feito para prestar as informações
necessárias, no prazo de 10 (dez) dias. Em seguida, remeta-se o processo à
Procuradoria Geral de Justiça.